"Ministro é réu por comprar o mesmo terreno duas vezes
O ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra Coelho (PSB), usou recursos públicos para comprar o mesmo terreno duas vezes, quando era prefeito de Petrolina, em Pernambuco.
A primeira compra ocorreu no final de seu primeiro mandato, em 1996, por R$ 90 mil. Na segunda, já em 2001, durante seu segundo mandato, o negócio custou R$ 110 mil.
Nas duas vezes, o dinheiro beneficiou o mesmo empresário, José Brandão Ramos, sob a mesma justificativa: transformar a área em um aterro sanitário. As aquisições custaram R$ 500 mil, em valores atualizados.
Ramos é primo do secretário de Agricultura de Pernambuco, Ranilson Ramos, que é do PSB, partido do ministro.
O Ministério Público de Pernambuco entrou com uma ação em 2003 contra Bezerra por improbidade, na qual pede devolução do dinheiro (…)
Além da compra em duplicidade, o Ministério Público cobra uma diferença de R$ 15 mil entre o valor liberado e o de fato pago.
A assessoria do ministério não respondeu o questionamento sobre esse ponto.
No início do processo, Bezerra e o Ministério Público chegaram a firmar um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) no qual ele se comprometia a cobrar a devolução do dinheiro em troca da suspensão do caso.
O acordo chegou a ser confirmado pela Justiça do Estado. Dias depois, o Ministério Público voltou atrás, alegando que em ações de improbidade não cabe esse acerto. O Judiciário anulou o acordo.
Bezerra recorreu ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) para manter o TAC. Em novembro de 2011, foi publicada a decisão do ministro Francisco Falcão negando o recurso e determinando o prosseguimento do processo”.
O TAC – termo de ajustamento de conduta – é uma espécie de última chance que a lei dá antes que a pessoa seja processada. Por exemplo, se o dono de um bar constantemente incomoda os vizinhos com música acima do volume permitido, o Ministério Público pode processa-lo. Mas processar é uma coisa, ganhar a causa é outra. E ainda que a probabilidade de ganhar a causa seja muito alta, a vitória só acontecerá no futuro. E mesmo depois de vencer, e o dono for multado, o bar terá de abaixar o som: se o dono não colaborar, o problema persistirá e o Ministério Público terá que pedir que a Justiça tome medidas mais drásticas, como fechar o bar; e isso vai tomar mais tempo. E tempo é dinheiro. Dinheiro público e do dono do bar. Além de os vizinhos continuarem sendo incomodados pelo som alto até que o dono resolva cumprir a sentença ou tenha o bar fechado.
O TAC serve justamente para evitar situações como essas. Em vez de sociedade e dono do bar gastarem meses e fortunas brigando na Justiça, o MP propõem que o dono ajuste sua conduta imediatamente. É como se o MP dissesse ‘você não agiu corretamente até o momento, mas se você passar a agir de acordo com esses termos que eu estou propondo, eu não proporei uma ação contra você’. Essa espécie de acordo – chamado de ‘termo’ – funciona para as duas partes: quem está errado tem uma última chance de agir corretamente antes de ser processado. E o MP, além de poupar tempo e alcançar o objetivo desejado imediatamente, fica com uma garantia nas mãos: ao assinar o TAC a outra parte está dizendo algo como ‘reconheço que errei e quero me redimir’. Se a outra parte desrespeitar o acordo, fica muito mais fácil para o MP provar que ela estava de fato agindo incorretamente, já que ela já admitiu o erro em sua conduta ao assinar o TAC.
Pois bem, por que então no caso do ministro na matéria acima o TAC foi considerado ilegal pelo STJ? Porque nas ações de improbidade administrativa o objetivo principal não é ressarcir os cofres públicos (mesmo porque alguns danos causados pelos servidores públicos são tão grandes que jamais serão reparados), mas punir o servidor improbo, impedir que ele volte a causar novos danos ao governo e à sociedade, e mostrar aos outros servidores como os desonestos são tratados. Se o TAC fosse possível nos casos de improbidade administrativa, o servidor improbo teria uma porta de escape de fácil acesso. Algo do tipo ‘vou agir desonestamente, e se descobrirem, basta eu assinar o TAC e ressarcir os cofres públicos para sair ileso. Sequer serei processado”. E obviamente isso daria um enorme incentivo aos servidores públicos para agirem de forma desonesta. Se você pensar em um homicida em vez de um servidor público, verá como o TAC não faria qualquer sentido: você jamais deixaria de processar um homicida só porque ele, depois de pego, decidiu assinar um acordo para ressarcir a família da vítima e se comprometendo a não matar mais pessoas.